quarta-feira, abril 23, 2008

Portugal navega à vista na UE

Rapto da Europa (30)



6 perguntas a:
Manuel Lobo Antunes, Secretário de Estado dos Assuntos Europeus

Realizadas em 23/4/2008

O Dr. Manuel Lobo Antunes é o Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, responsável directo pela nossa política face á Europa. Nesta sequência de perguntas e respostas, realizadas no “site” do Expresso (http://aeiou.expresso.pt/gen.pl) e respondidas on-line, podemos confirmar até que ponto é que Portugal não tem política alternativa à posição “seguidista” relativamente aos ditames da União Europeia. A falta de qualquer estratégia fica demonstrada quando o Dr. Lobo Antunes refere que o defunto Tratado Constitucional visava uma federação europeia, o que não é novidade mas foi sempre explicitamente negado pelos sucessivos governos portugueses, quando afirma convictamente que não há qualquer transferência de soberania com o Tratado de Lisboa e quando revela desconhecer os custos e benefícios para o nossos país da sua assinatura.
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Ricardo Pinheiro Alves: Porque é que os portugueses não se podem pronunciar sobre o processo de integração europeia em que Portugal participa?
Resposta: O Senhor Primeiro-ministro, no Parlamento, explicou longamente e em detalhe (do meu ponto de vista, claro) os motivos pelos quais o governo decidiu não propor um referendo ao tratado de Lisboa. Ao facto não foram alheias as nossas responsabilidades europeias e as consequências das nossas decisões no todo europeu.
Aproveito a sua pergunta - que compreendo - para dizer que, ao contrário do que muita gente diz o Trado de Lisboa é realmente diferente do tratado constitucional. Este pressupunha uma "refundação da Europa, um projecto político, um caminho verdadeiramente supra-nacional de tipo federal para a Europa. Só os Estados têm constituições. Por isso o tratado constitucional supunha (ou pré-supunha a formação de um Estado europeu). Nada disso com o Tratado de Lisboa, que é um tratado de "reforma" ao que existe e não aponta qualquer caminho definitivo em termos de construção política à "nossa" Europa.
Comentário: Porque é que só agora, quando a constituição já foi abandonada, é que o Governo admite que estava em causa um projecto federal para a UE quando nunca o admitiu durante as discussões para a dita constituição? Esta atitude confirma a falta de transparência e de honestidade com que os governos europeus, incluindo o português, têm abordado as questões europeias.

RPA: Qual a legitimidade real do Tratado de Lisboa se os povos europeus não se podem pronunciar?
Resposta: Os povos europeus pronunciar-se-ão a nível nacional conforme as suas escolhas constitucionais e políticas. O tratado será ratificado por cada estado membro de acordo com a opção concreta que fizer. Os portugueses fá-lo-ão por intermédio dos seus deputados à AR democraticamente eleitos em eleições gerais e livres.
Comentário: A promessa de referendar o tratado constitucional pelo actual primeiro-ministro, antes de os portugueses o elegerem, é simplesmente ignorada pelo Dr. Lobo Antunes. Porquê? Porque não interessa recordar coisas tristes.

RPA: Porque é que o Governo não indica aos portugueses quais as áreas em que transferimos soberania com a assinatura do Tratado de Lisboa?
Resposta: O tratado de Lisboa - e esta é uma das inovações - lista claramente as competências que são exclusivas dos estados, as que são partilhadas com a União e aquelas que são exclusivas da União. As chamadas competências em matéria de política externa, defesa, segurança, finanças mantêm-se no domínio intergovernamental.
Às vezes é necessário partilhar poderes com outros porque essa partilha só nos beneficia. O "orgulhosamente sós" não tem definitivamente lugar no mundo da globalização. Não há, no meu entender, novas transferências de soberania com o tratado de Lisboa. Mas sei que alguns entendem o contrário e respeito essas opiniões.
Comentário: O Dr. Lobo Antunes opta explicitamente por ignorar transferências de soberania em 105 novas competências, que foram atribuídas á UE com este tratado, e em 68 novas áreas, que passam a ser objecto de maioria qualificada. Para além disso, Portugal perde as presidências rotativas do Conselho, perde um comissário europeu em permanência. Mas nada disto “comove” o Dr. Lobo Antunes, para quem as transferências de soberania são inexistentes.

RPA: Porque é que as respostas habitualmente dadas pelo Governo sobre o Tratado de Lisboa se centram sempre nas supostas virtudes do processo de integração europeia e nunca abordam directamente os custos e os benefícios da entrada em vigor do referido tratado?
Resposta: Porventura tem razão. Se for esse o caso, penitencio-me desse mal. Haverá certamente algumas contrapartidas (prefiro a custos), mas como em tudo terão que ser avaliadas em função dos benefícios. E no prato da balança julgo, estou convicto (mas de novo, aceito obviamente ponto de vista contrário) que aquele pende claramente a favor das vantagens.
Comentário: Apesar de admitir que posso ter razão o Dr. Lobo Antunes limita-se a reproduzir o já estafado discurso dos Governos portugueses. Factos, não apresenta nenhum.

RPA: Porque é que o Governo não apresenta publicamente os custos que Portugal vai ter de suportar com a assinatura do Tratado de Lisboa?
Resposta: Não sei exactamente de que custos fala (materiais? políticos?). Em todo o caso, e qualquer deles, serão divulgados quando forem conhecidos e se os houver (sinceramente, em termos políticos acho que vamos ter, em vez de custos, lucros).
Comentário: Esta resposta só vem reforçar a convicção da falta de estratégias política do governo português. Temos de fazer o que os europeus querem, para sermos “bem vistos”. Se há custos não interessa. Quando vierem, se os houver, serão então divulgados. Há muito que não lia a admissão de tamanha irresponsabilidade.

RPA: Porque é que o Governo prometeu consultar os portugueses sobre o Tratado de Lisboa e não o fez?
Resposta: Julgo que já respondi anteriormente a esta pergunta. Julgo que não é por não haver referendo que o debate intenso, livre, contraditório, amplo, sobre o tratado de Lisboa não será possível.
Comentário: Quando não se conhecem detalhadamente os custos e os benefícios de uma opção política que nos afecta a todos e se decide com base na boa impressão que tem de se causar lá fora, não há debate sério possível.

2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Pelo menos ainda navega. Pior é se começa a meter água, isto para manter a metáfora náutica

Ass: Capitão Gancho

4/23/2008 5:56 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Seria melhor se voasse como o Peter Pan, ó Capitão Gancho, porque navega enquanto não bater num rochedo.

4/24/2008 8:05 da manhã  

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