segunda-feira, novembro 12, 2007

Da União Europeia como um projecto socialista

O Rapto da Europa (3)

(Opressão socialista 6)



Os objectivos formais da União Europeia (UE), a liberdade, a democracia, a paz e o desenvolvimento económico e social são consensuais e promovidos pelas três principais ideologias políticas: Conservadores, liberais e socialistas. No entanto, o mesmo já não se pode dizer da prática política nas instituições da UE nem dos objectivos implícitos e do espírito que desde há alguns anos passou a imperar nas elites europeias. Uma análise da organização e do funcionamento da UE é reveladora desta situação.

Em primeiro lugar, a lei democraticamente aprovada deixou de ser um elemento central na legislação europeia. As leis são definidas e aprovadas por uma burocracia sem legitimidade democrática, no caso das políticas comuns em que os poderes foram já transferidos para o centralismo de “Bruxelas”. Ou, quando não aprovadas, são definidas pela mesma burocracia, que assim influencia decisivamente o seu conteúdo. Ao contrário do que se passa nos Estados, onde as burocracias são geridas por governantes eleitos, o funcionamento da Comissão Europeia assenta numa completa ausência de legitimidade. O Parlamento Europeu, com alguma legitimidade democrática, tem uma capacidade de intervenção muito limitada.

Em segundo, e não estando em causa, formalmente, a independência do poder judiciário face ao poder político, tem-se assistido a constantes tomadas de posição do Tribunal de Justiça da UE contrárias à autonomia dos povos e países, e que vão no sentido da tendência centralizadora exibida pelas restantes instâncias europeias. Ou seja, a jurisprudência europeia decide sistematicamente, e quase exclusivamente com base no argumento da construção do Mercado Único, na direcção de uma maior concentração de poderes em “Bruxelas” sem que esteja explicitamente estabelecida, em qualquer dos tratados constitutivos da UE, uma vontade comum de se caminhar para um Estado europeu ou qualquer forma equivalente de organização centralizada. Em suma, o predomínio da burocracia, administrativa e judicial, em prejuízo da legitimidade democrática e conducente à centralização e acumulação do poder é claramente uma característica dos regimes e da ideologia socialista.

Em terceiro lugar, a ideia de um Estado limitado também não vingou no caso da UE. A transferência de responsabilidades para as instâncias europeias nunca teve correspondência na diminuição da estrutura pública nos países membros. Pelo contrário, continua a assistir-se a um aumento da presença do Estado a todos os níveis da sociedade. Esta presença, em vez de essencialmente limitada a dois níveis (ou a três, no caso dos países com entidades intermédias democraticamente eleitas), nacional e local, foi aumentada com um nível supra-nacional. Para além disso, não é evidente o funcionamento de mecanismos limitadores do crescimento do Estado, como a ideologia conservadora defende. O mercado, instituição que por natureza tem esta função, é usado como justificação para a propagação de leis e como instrumento ao serviço da centralização dos poderes. Os mecanismos formais que existem, como o princípio da subsidiariedade, não funcionam na prática e apenas servem para serem relembrados, numa hipócrita demonstração de que “existem”, por parte dos que apoiam o centralismo europeu e ignoram a sua aplicação.

Do mesmo modo, e em quarto lugar, a distinção clara entre sociedade e Estado é desfeita quando as instâncias da UE, especialmente a Comissão Europeia, utilizam fundos públicos para promover organizações da sociedade civil criadas propositadamente para defender as utopias dos dirigentes europeus. Ou quando promovem supostos debates de ideias em que não é permitida a participação de qualquer oposição a uma UE centralizada. Ou quando patrocinam publicações, supostamente livres e independentes, para defender uma “Europa cada vez mais unida”. Ou ainda quando pagam programas de televisão e de rádio, como os que actualmente são transmitidos por toda a Europa, para promover a ideia europeia. Todos estes procedimentos, assim como o contínuo crescimento das estruturas do Estado, são característicos de uma visão socialista do Estado: Crescentemente dominador e manipulador dos órgãos de comunicação social.

Em quinto lugar, as instâncias comunitárias funcionam no âmbito de um consenso artificial e centralizado, em que dois grupos, socialista e popular, ocupam todos os cargos relevantes e distribuem entre si o grosso dos dinheiros públicos que têm à sua disposição e que provêm das leis por eles próprios aprovadas. No Parlamento Europeu respira-se uma atmosfera opressora em que os que não alinham no “consenso” são positivamente marginalizados nas comissões de especialidade e em outros fóruns. Na Comissão Europeia sobrepõe-se a voz da propaganda à livre argumentação, como o demonstram as campanhas organizadas pela Comissária Wallstrom e pelo Presidente Durão Barroso. Apenas no Conselho, onde os países estão representados, existe verdadeiramente discussão. Este duopolio podre encena constantemente a existência de uma oposição ao centralismo europeu, em que socialistas e populares vão alternando de função. Mas a real oposição, pressuposto base de qualquer regime democrático, tem uma capacidade de actuação muito limitada dentro das instâncias europeias.

Em conclusão, todo o projecto de integração europeia se está a transformar num ideal socialista. Os objectivos formais da UE, já parcialmente alcançados, deram lugar a uma utopia ultra-racionalista em que a “Europa” visa adoptar, com uma voz única onde as dissonâncias são afastadas, uma postura internacionalista e se pretende afirmar como a superior “razão do Universo”. Neste âmbito, o mercado, por via da “construção” do Mercado Único, foi dogmatizado e transformado numa ferramenta desta utopia. Esta nova forma de império assenta na necessidade de um governo “europeu”, desrespeitando a legítima soberania nacional, e nos seus objectivos implícitos, definidos centralizadamente e pouco precisos, e por isso impossíveis de controlar por povos e cidadãos. O que passa para o público é um conjunto de clichés, onde palavras como solidariedade, direitos, humanismo e união são constantemente usadas e abusadas.
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