EU NÃO SOU ENGENHEIRO (9)
A saga termina aqui. Para quem só chegou agora, sugiro que leia esta série de baixo para cima.
"Com a curiosidade que o momento requeria, fui consultar os meus dados, para ver se já tinham sido devidamente rectificados. Deparei-me com a seguinte pérola da titularite aguda que assola este país:
Quando consegui parar de rir, respondi com a seguinte mensagem em três fascículos (só nos são permitidos 2000 caracteres de cada vez)
Estimadíssimos Senhores,
Fiquei muito feliz por ver que, finalmente, tiveram a amabilidade de agir sobre os meus dados pessoais.
Constato que ainda não lhes é possível usar o meu número de telefone porque começa por 30 e isso faz muita confusão ao vosso departamento de informática.
No entanto, folgo em constatar que não perderam o sentido de humor no que toca aos restantes dados pessoais.
Assim, nas habilitações literárias, de licenciado fui despromovido a 12 ano. Na verdade, tenho o grau de mestrado em física tecnológica, mas como não faço tenções de lhes apresentar provas desse facto, fico muito satisfeito por ao menos me reconhecerem o 12º ano sem necessidade de prova formal.
Como não penso que sejam elitistas ao ponto de me tratarem pior por ter uma mera escolaridade obrigatória, o 12º ano fica muito bem, pois também me deu muito trabalho a fazer e, de facto, possuo esse grau. Deixemos, portanto, as habilitações literárias que estão muito bem assim.
No título honorífico, puseram "sem título honorífico". Não posso deixar de confessar que me doeu essa dura chamada à realidade. Mas, de facto, não me considero titular de nenhum título de nobreza (tive um trisavô visconde, mas acho que já não conta), não fui ordenado sacerdote, nunca recebi nenhuma comenda e, à semelhança do nosso Primeiro-ministro, não estou inscrito em nenhuma ordem, tenho de me conformar à minha condição de vulgar plebeu sem título honorífico quando, para mais, me recuso a mostrar-lhes o certificado de habilitações. Portanto, também aqui no título honorífico, estamos de acordo. Sou simplesmente o José.
Agora, na profissão... aqui temos um problema. O problema para o qual lhes tenho vindo a chamar a atenção: o facto de eu não ser engenheiro civil, tornou-se agora bastante mais grave. É que acusam-me de ser engenheiro civil sem estar inscrito na ordem (caso contrário teria o título de Eng.) e, horror dos horrores, com as habilitações literárias de um 12º ano. (Continua).
É que nem o nosso primeiro-ministro se atreveu a reclamar o título de eng. civil com um simples 12º ano. Ele tem, pelo menos, o título do ISEC e, in dubio pro reo, afirma que concluiu a licenciatura em engenharia civil.
Os senhores, ao dizerem que eu sou engenheiro civil sem estar inscrito na Ordem dos Engenheiros (caso contrário, tinha o eng) e com um simples 12ºano de habilitações literárias, colocam-me numa posição muito delicada, incorrendo mesmo num crime de usurpação de título. E eu não tenho o aparelho do maior partido político português a proteger-me as costas quando a coisa der para o torto.
Finalmente, chegamos ao Nome preferencial, onde contrariam disposições anteriores e me apelidam de Eng. J. L. Mxxxxxxxx. Ora bem, até há umas semanas atrás, eu não teria grande coisa a opôr, visto que sou licenciado em engenharia física e todos os licenciados deste país são doutores e engenheiros. Infelizmente, agora os tempos são outros. Só pode reivindicar-se engenheiro quem estiver inscrito na Ordem dos Engenheiros. Ora, para minha grande vergonha, não pago quotas a tão nobre instituição, pelo que terei de abdicar daquelas três letrinhas. Nem sequer posso pedir um simples "lic" ou um "mestre", porque na minha teimosia me recuso a entregar-lhes o certificado de habilitações. Portanto, proponho que fique simplesmente o José Luís Mxxxxxxxx ou o Zé, para os amigos.
(Continua)
Lamento o trabalho tempo e esforço que essas alterações possam causar. Espero até não provocar um precedente grave que os obrigue a ir pedir a todos os vossos clientes Drs. e Engs. o certificado de doutoramento ou o cartão de membro da Ordem dos Engenheiros, respectivamente.
Mas peço-lhes, rogo-lhes, suplico-lhes, retirem o mal-fadado "Engenheiro Cívil" da minha ficha de dados . Nunca chamei a ninguém nenhum nome que não fosse merecido. Esse é claramente imerecido. Prometo manter todas as minhas contas no vosso estimável banco. Mas, por favor, não digam a ninguém que eu sou engenheiro civil.
Do sempre vosso,
Zé"
18 Comments:
Rui, que história maravilhosa! Assim se espelha um país...
Quando conseguir parar de rir comento...
Muito bom... ...se não fosse verdade. Há mulas que mesmo com pálas nos olhos vêem mais.
cara fuckitall,
é, de facto, o espelho do país.
ENNNRRRR!!!!!!!!
Meus amigos, confesso que não lia habitualmente este blog (agradeçam ao Arrastão), mas o profundo júbilo que me provocaram deixa-me vontade de voltar.
Mais, rogo-lhes para que publiquem eventuais sequelas, pois não estou à espera que o banco se fique, como mostram as três cartas (?) a reclamar sempre a entrega da certidão de habilitações.
Obrigado por este bocadinho.
Antes de mais, o meu obrigado profundo, sincero, honesto - nada como uma boa gargalhada para começar o dia.
Isto passa-se no Montepio, e não se muda uma instituição com uma campanha de marketing. O novo logo é muito bom, a imagem resultou, mas o "substracto" continua o mesmo. E vai continuar: o - ou os funcionários envolvidos nesta kafkiana (kafkiana? Ionesca?) troca de correspondência - não podem ser despedidos, pois a incompetência não é "justa causa" para despedir uma pessoa; mesmo que não ler, ou ler e não apreender, a correspondência dos clientes seja reconhecidamente uma prova de incapacidade para quem ocupa lugares daqueles.
Para um banco que provavelmente gastou milhões na campanha de imagem, não está mal.
Claro que, provavelmente, isto se passaria tb noutros bancos, ou noutras empresas - a burocracia é o melhor aliado da incompetência, e onde esta anda, está aquela. Afinal, há uma dúzia de anos pedi a uma funcionária da Capitania que me facultasse o suporte legal de uma decisão qualquer da dita Capitania, e a senhora respondeu-me que não ma podia dar porque era "confidencial" (verbatim).
Pensai durante algum tempo compilar histórias destas, mas depois abandonei a ideia: o tempo e os blogs serão mais eficazes.
A maravilha desta história é que durante muito tempo vai ser impossível olhar para o logo do Montepio e não rir...
:))
A estória é gira e dá vontade de rir.
Mas já agora, talvez fosse conveniente ler bem o que é solicitado...
O Montepio (como todos os bancos...) está seguir as instruções do Banco de Portugal e para colocar uma nova profissão precisa de a certificar.
Tantas mensagens trocadas e ainda não percebeu que lhe pedem para certificar a profissão que quer colocar (para substituir a que lá está..) e não lhe pedem para certificar que "não-é-engenheiro-civil"... è um facto que não explicam bem, mas um homem inteligente e espirutuoso devia ter percebido.
Pode sempre tentar, dizer que está desempregado...talvez isso resolva o seu problema. Mas não se surpreenda se tiver impacto nos creditos que possa ter ou pior que constitua um crime qq de perjurio.
mas concordo que fazer de conta que não percebeu dá posts mais divertidos.
Acho esta história uma verdadeira palhaçada, e a todos os títulos provocadora. Afinal, o excelentíssimo senhor que não queria ser tratado por engenheiro mantém no seu nome preferencial, que pode ser modificado pelo próprio, Eng. Só quem não tem mais nada que fazer...
Ainda bem que há pessoas que gostam de gozar com o trabalho de outrém!
Espero que sempre que os funcionários da empresas que prestam-vos serviços vos tentem compreender os senhores façam de conta que nada sabem!
Espero que esta história rídicula que surge num momento muito oportuno não seja verídica! Pois a ser é muito má! Não só para os funcionários do banco como para um senhor que se diz mestre!
Será que quando defendeu as suas teses este funcionário do banco fez-lhe alguma abordagem indevida?
Hoje os bancos estão cheios de "lic" a trabalhar como caixa, e portantó, é dificil lidar com outros papeis que não notas...
Obrigado Sr. Conde da Vila, em aperto, qualquer ajuda é bem vinda.
A estoria e inacreditavel e os meus sinceros agradecimentos ao autor pela insistencia na destruicao deste comico equivoco.
Com um pouco de provocacao, nao deixa tambem de ser interessante constatar o abusivo tempo livre que um Engenheiro Fisico em Portugal parece ter. Trabalha no Instituto Tecnologico e Nuclear?
Em Portugal o que parece abusivo para um eng. fisico é a falta de trabalho e a falta de reconhecimento da profissão!! Abusivo penso ser tambem criticar como anonimo o que os outros fazem no seu tempo livre, sendo que esta "comédia" deve ser divulgada para mostrar a incompetencia das grandes instituições e a burocracia generalizada neste nosso Portugal.
P.S. Gostava de saber o desfecho da situação, para saber se tenho que requesitar algum não-diploma.
Em primeiro lugar esta sequência de mensagens serviu para me rir durante um bocado :)
Para o "Anónimo" que pergunta:
"ainda não percebeu que lhe pedem para certificar a profissão que quer colocar (para substituir a que lá está..) e não lhe pedem para certificar que "não-é-engenheiro-civil""
Faça o favor de voltar a ler os mails e vai ver que em várias passagens o Sr. José diz claramente o que pretende ver nesse campo, por exemplo:
"agradeço-lhes que retirem esse dado da profissão"
ou
"agradeço que retirem qualquer menção à minha profissão"
Parece-me completamente óbvio que o Sr. José diz claramente que não quer qualquer título. Penso que os serviços do banco demonstraram incompetência ao serem incapazes de perceber português.
É uma história deliciosa, de facto, mas já nada me causa estranheza neste belíssimo país do "faz-de-conta". Como a Universidade Independente vai fechar, talvez o Montepio Geral possa começar a atribuir graus académicos e assim compor as nossas estatísticas para Bruxelas ver.
A troca de e-mails está excelente. Gostei imenso e vou voltar.
Alexandre Cartaxo: não é preciso ser o Montepio a atribuir graus sem fundamento - o governo criou o "Programa Novas Oportunidades" precisamente para fazer isso!
"agradeço que retirem qualquer menção à minha profissão"
Tal como o anonimo acima disse, talvez fosse isto o que o banco deveria fazer-lhe - atribuir-lhe o titulo de desempregado e fazê-lo arcar com as consequências.
Não tem mais nada que fazer do que gozar com trabalhadores honestos que só estão a respeitar as regras impostas pelo estado?
Enviar um comentário
<< Home